quarta-feira, abril 25, 2012

Impossível...

(foto daqui)

... seria não escrever nada sobre esse direito precioso que assiste ao ser humano no dia que o calendário hoje assinala. Liberdade. Algo que tomamos como dado adquirido na sociedade portuguesa dos dias de hoje volvidos que são 38 anos sobre o 25 de Abril de 1974. Mudança de uma revolução que se iniciou com música e que se imortalizou com cravos vermelhos. Salgueiro Maia, um dos rostos dos Capitães de Abril que mais marca a memória de tantas pessoas. O olhar sereno de um homem que, junto com tantos outros, marcou o ponto final numa página da longa História de Portugal.
Muitas vezes tenho pena que, nos bancos de escola, não se dê o devido valor a datas tão marcantes da história mais recente deste nosso País. Pelo menos falo por mim que não tive oportunidade de chegar mais além do que a Implantação da República no que toca às aulas da disciplina de História. Sei que poderá ser algo recorrente nos meus desabafos no que toca a efemérides relacionadas com Portugal mas se calhar valia a pena pensar nisto com maior profundidade. Não teremos todos nós bem patente na nossa memória as diversas entrevistas que muitas vezes os canais de televisão fazem nas ruas deste Portugal questionando sobre o significado desta ou daquela data? Pois é, a maior parte não sabe responder e, quando responde, habitualmente troca a data dos acontecimentos... E tenho pena que assim seja. Tão preocupados com o que se passa fora de portas e depois deixamos adormecer para todo o sempre as grandes datas do nosso País e os grandes heróis que foram pincelando a nossa História. E nem me vou debruçar sobre a questão dos feriados pois seria mais do mesmo e não é para isso que hoje escrevo...
Antes de 25 de Abril de 1974, o conceito de liberdade era algo de utópico. As mulheres eram pertença dos seus maridos. As enfermeiras não podiam pensar em casar (apesar de algumas arriscarem para terem uma família e um companheiro nas suas vidas...). Nem todos os livros podiam ser lidos. Ou melhor, quase nenhuns! O medo de tantos em relação à PIDE transpirava por todos os poros. A mim me foram contadas muitas histórias na primeira pessoa de quem presenciou as famosas visitas da PIDE fora de horas a casa. O medo de não saber se alguém seria levado naquela noite. A angústia de não conseguir saber o destino das pessoas que mais se amava. Faz-me confusão que hoje em dia se fale em falta de liberdade... Faz-me confusão que se diga que não há liberdade de expressão. Faz-me confusão que existam tantos jovens que se achem oprimidos por não poderem ir à discoteca da moda. Quando ser-se oprimido é muito mas muito mais do que isso...
Devemos sempre aprender com a nossa História para que os erros do passado não se repitam. Pode parecer cliché ou frase feita mas acho que faz todo o sentido olharmos para trás para o papel amarelecido e retirar dele grandes lições de vida. Ensinamentos que nos permitam não regredir nos direitos e deveres dos homens e mulheres que constituem a nossa sociedade. Histórias que nos façam sair da zona de conforto e que não nos deixem tornar em seres adormecidos e alienados da realidade. A liberdade não é fazer aquilo que bem se entende quando bem se entende. É muito mais do que isso! Liberdade é ter consciência do que se é e poder argumentar sobre as nossas vontades e as nossas angústias. Liberdade é poder estar-se com os seus sem medo de alguém ser levado para uma sala escura... Liberdade é não se deixar amordaçar por panos invisíveis que nos bloqueiam o pensamento, nos toldam a vista e nos retiram as forças. Liberdade é tudo isto e muito mais! 
Por isso, não se esqueçam nunca destes homens de nome conhecido e de tantos outros de nome desconhecido que lutaram contra um regime instalado, vontades de ferro e acreditaram que era possível. Não deixemos que a sua memória seja insultada acomodando-nos a algo que não nos satisfaz. Porque as memórias de grandes homens e de grandes mulheres devem ser sempre inspiradoras...

(foto daqui)


E este 25 de Abril de 2012 não se faz apenas de memórias... Miguel Portas faleceu ontem após uma luta de dois anos contra o cancro. Escolhas partidárias à parte, o panorama político português ficou assim mais pobre. Fundador do Bloco de Esquerda, deixa hoje não só a Esquerda portuguesa de luto mas como todo um país. Tanto para os seus pares de Esquerda como para os seus adversários, os elogios são patentes em cada declaração. Ouvi hoje que, de uma troca de ideias com Miguel Portas, nunca se chegava ao fim exactamente no mesmo ponto em que se iniciou. Algo de novo se apreendia destas trocas de ideias saudáveis. Mais do que olharmos para a orientação política que se adoptou em determinado ponto da vida, deve olhar-se para o homem que estava por detrás de todas as declarações, de todas as convicções, de todas as vontades. E será um homem culto, defensor das suas convicções, que deverá ser recordado por todos a partir de hoje... Mais do que pensar em alguém que abraçou o Comunismo em determinada fase da sua vida, há que olhar para o homem que se escondeu por detrás das ideologias mesmo que sejam contrárias às nossas. E por isso se diz... Até sempre, Miguel!

"Sou comunista no sentido de que continuo a pensar que é possível ao homem construir uma sociedade de abundância em que o Estado seja dispensável e em que a sociedade seja capaz de se organizar e de se auto-administrar, distribuindo essa abundância de forma igualitária para que cada um possa seguir os seus caminhos ao longo da vida sem atropelar o próximo" in entrevista à revista Visão em 2008. 

E é isto mesmo que é a liberdade... Cada um ter a possibilidade de conseguir seguir os caminhos que deseja desenhados na sua vida sem atropelar o próximo. 

2 comentários:

  1. Acho que disseste as palavras certas e ao mesmo tempo fizeste homenagem a duas grandes figuras portuguesas. Bom 25 de Abril*

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    1. Obrigada, vanessa. Muitas vezes tenho receio de escrever sobre determinados assuntos com o receio de ser mal interpretado, com receio de não conseguir expressar claramente o que vai aqui dentro. Mas acho que no dia 25 de Abril não seria possível escrever de outra forma. Porque existem pessoas e acontecimentos que merecem a nossa homenagem não apenas um dia por ano mas sempre! :)

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