sábado, janeiro 25, 2014

Andei...

... muito tempo a pensar se iria escrever sobre este assunto ou não. Será apenas mais a opinião de uma pessoa. Será apenas mais um texto. Será apenas mais um post. Mas sinceramente tenho de escrever qualquer coisa...

Meco. 15 de Dezembro de 2013. Semana de alerta vermelho em quase todo o Portugal Continental fruto das condições extremamente adversas de mar. Ondulação muito forte. Mau tempo. E seis jovens perdem a vida numa praia do Meco ao serem arrastados por uma onda...

Mas tantas incógnitas rodeiam este dia e este local...

Muito se tem falado sobre os acontecimentos. Muito se tem divagado sobre este assunto. Muitas foram as declarações feitas nos meios de comunicação, seja por entidades oficiais, seja pelos familiares ou seja por outras pessoas que foram sendo entrevistadas sobre este terrível acontecimento. Muito se tem escrito sobre este assunto também na blogosfera pois este acaba por ser um espaço por excelência para as pessoas exprimirem as suas opiniões sobre os mais diversos temas e trocarem ideias com as pessoas que vão comentando os seus posts. Provavelmente, um dos posts que vi gerar mais controvérsia nos últimos dias foi o escrito pela Pipoca Mais Doce. Eu própria também comentei este post e pude constatar que os comentários não poderiam ser mais divergentes. Se, por um lado, todos compreendem a angústia das famílias em tentar perceber como pode acontecer aquela tragédia, por outro lado, muitas são as vozes que se levantam para defender a praxe com unhas e dentes como se disso dependesse o futuro do nosso País. Muitas foram as vozes que se levantaram contra a Pipoca, chegando mesmo a dizer que nunca esperavam ler as palavras que ela escreveu num blog de que gostam tanto. Desde dizerem que a Pipoca não compreende o que é o espírito da praxe e da importância que esta tem para se fazerem amigos para a vida e de preparar os jovens para o mercado de trabalho que os espera. A Pipoca limitou-se a dizer o que pensa. E refere claramente de que não gosta da praxe nem tão pouco de especulações e por isso espera que tudo seja esclarecido e que o silêncio até agora mantido pelo único sobrevivente seja quebrado e que as dúvidas sejam dissipadas de uma vez, a bem da possibilidade das famílias conseguirem fazer o luto e não estarem numa permanente dúvida sobre o que aconteceu com os seus filhos naquele dia 15 de Dezembro...

Antes de mais, as pessoas têm de perceber um ponto muito importante que rege a blogosfera: quem escreve num blog é que decide o que lhe apetece ou não escrever e de que forma. As opiniões são de cada um e, tal como na vida fora da blogosfera, podemos ou não concordar. O velho ditado de "não se pode agradar a gregos e troianos" é mais do que verdade e por isso não podemos esperar que tudo aquilo que escrevemos nos nossos blogs seja do total agrado de quem nos lê.

E a praxe e todos os comentários que li sobre ela... Bem, eu fui aluna universitária. Trajei e estive envolvida na recepção aos caloiros na minha universidade ainda que nunca tenha praxado. Sim, nunca praxei porque optei por uma outra via de relação com os caloiros. Porque acho que a praxe, quando mal gerida pelos chamados "doutores" ou "veteranos", pode dar asneira. Não digo que seja assim em todas as universidades pois também conheço bons exemplos de fazer praxe, de que posso referir alguns da minha faculdade. Mas não vale a pena atirar areia para os olhos... A praxe não é boa na sua grande maioria dos casos. E há também que ter presente uma coisa: a praxe é feita por pessoas. E, muitas vezes, estas pessoas recorrem à praxe para descarregar as suas frustações sobre quem é mais indefeso. E olhem que sei do que falo... Por diversas vezes, vi formas indecentes de tratar os caloiros e e tantas outras chamei à atenção a alunos mais novos do que eu que estavam a praxar caloiros de que não é assim que as coisas devem ser. Quando disse anteriormente que não praxei, isso não significa que não tenha estado envolvida nas recepções aos caloiros da minha faculdade. Tive a sorte de estar numa faculdade em que existia um programa de mentorado em que alunos mais velhos faziam a recepção e o acompanhamento aos caloiros no seu novo local de estudo. Basicamente, era ajudá-los em tudo o que precisassem desde dicas quanto à faculdade, integração nos cursos e departamentos que escolherem, a habitual troca de apontamentos e dicas sobre os professores ou dicas sobre a cidade a que chegavam, caso se tratassem de alunos de fora. E posso dizer que este foi, sem dúvida, um projecto que gostei muito de abraçar pois tenho amigos para a vida entre os caloiros que tive o grande prazer de apadrinhar. Ainda hoje sou chamada carinhosamente de "madrinha". Mas é pena que não seja assim em todo o lado e que nem todos  guardem boas recordações dos alunos mais velhos...

E a praxe e a construção de cidadãos mais preparados para a vida profissional... Sinceramente, isto só me dá vontade de rir de tão ridículo. Dizer que a praxe estimula o espírito de equipa e e de entreajuda e que ajuda a criar valores entre os jovens... Bem, eu poderia lembrar-de de mil e uma maneiras que, essas sim, permitem construir cidadãos melhores para Portugal. Com mais valor. Mais sentido de disciplina, de dedicação ao seu País e com muitos mais valores do que a situação da praxe. Ouvir jovens dizerem coisas destas sobre a praxe, apenas me faz lembrar situações de quase lavagem cerebral em que se é incitado e dizer determinadas coisas... Quem assim pensa não pode estar mais alheado da realidade. Os valores não se adquirem na praxe. O espírito de equipa e de entreajuda não é na praxe que é adquirido. Ser um melhor cidadão não é conseguido desta forma...

O que aconteceu naquela praia, a estranha constatação do traje, telemóvel e barrete do Dux estarem secos quando todos os outros seis jovens foram arrastados pelo mar, as chamadas e sms que foram enviados, a limpeza que se dizer ter sido feita à casa pelo Dux, as declarações feitas pelos vizinhos da casa onde estavam os jovens e do café a que foram a caminho da praia que tornam tudo ainda mais misterioso... Enfim... Há aqui demasiadas pontas soltas numa situação que foi de ponto final na vida de seis jovens. Numa semana de constantes avisos e em que o mar foi tantas vezes desrespeitado. É importante que se compreenda o que aconteceu. É importante perceber se aquele foi um fim-de-semana de praxe fora de portas da universidade. É importante perceber se foi algo que correu mal num fim-de-semana entre amigos. Detesto especulações. Detesto o "diz que disse"...

Mas é fundamental compreender o que ali se passou. É mesmo. Porque muitas já foram as vozes que se levantaram dizendo que este tipo de "retiros" eram habituais entre os alunos da Lusófona. Tudo a bem da definição das regras e actividades inerentes à praxe. Verdade ou não, confesso que é coisa para me fazer alguma comichão. "Retiro" para definição de regras da praxe? Isto soa-me, no mínimo, bastante estranho. Demasiado estranho para o meu gosto. E ainda que tudo se tenha passado na margem oposta à qual se localiza a universidade e num fim-de-semana... A universidade não se pode afastar da sua quota de responsabilidade. Ainda que seja fora das suas portas que tudo se tenha passado, há que perceber o que esteve por detrás deste fim-de-semana. Porque, se a ser verdade que se tratava de um fim-de-semana para delinear estratégias para a praxe e que isto era prática comum, era algo que tem directa ligação com a vida académica da universidade e tratavam-se de práticas que iria ser realizadas na universidade ou nas suas imediações. Não se pode cruzar os braços quanto a isto! Perdoem-me a comparação mas... Recordam-se do que foram as notícias em torno da praxe ocorrida dentro do Colégio Militar? Feita pelos próprios alunos e dentro das paredes do Colégio? Pois bem... Independentemente da instituição de ensino em causa, é de praxe que se está a falar e há que tomar medidas! Foi bem longe das instalações do Campo Grande... Who cares? Há que ouvir todos os envolvidos na praxe da universidade (e não apenas o Dux, no meu ponto de vista...). Pois, se calhar, este foi o dia em que as coisas correram mal e, fruto de terem desaparecido pessoas no mar e de ter sido necessários activar os meios de busca e salvamento, os acontecimentos passaram a ser do conhecimento geral. Mas quantos mais fins-de-semana houve e continuará a haver destes para preparação das praxes em que as coisas não correm (tão) mal e nunca se chega a saber os verdadeiros acontecimentos?

Se calhar vale a pena olhar para este assunto um pouco mais a fundo...

2 comentários:

  1. "E a praxe e a construção de cidadãos mais preparados para a vida profissional... Sinceramente, isto só me dá vontade de rir de tão ridículo. " - penso exactamente o mesmo.
    De resto, este é um tema que dá pano para mangas e acho que está um bocado condicionado pela experiência que cada um teve da praxe. Na minha faculdade, por exemplo, não era abusiva (pelo menos no meu curso), era apenas, à falta de melhor palavra, parva. Uns quantos cânticos, palavrões e referências sexuais... Não cheguei ao ponto de me sentir humilhada mas também não me senti mais integrada por isso. O convívio fez-se na mesma, através de jantares e saídas... Penso que isso seja a verdadeira praxe? O sentido de união e pertença. Infelizmente depois a palavra acaba por ficar associada à descarga de frustrações e power-trips de uns quantos...

    Beijinhos, acho que escreveste muito bem sobre o tema. :)

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    1. A praxe, a meu ver, poderia ter perfeitamente um fim diferente e deixar recordações totalmente distintas na memória das pessoas se quem a faz não optasse pelo caminho mais simples e mais fácil. Uma integração bem pensada com actividades que desafiem os caloiros a conhecer, por exemplo, a nova cidade que os recebe parece-me ser muito mais útil do que chegar-se a situações de humilhação. Eu e tu não temos más recordações porque tivemos a sorte de estar em faculdades que não levam as coisas ao extremo mas infelizmente não é assim em todo o lado. Estou em crer que esta triste tragédia vai trazer
      à luz do dia muitas situações e que permita que situações destas ou outras não tornem a acontecer.

      Obrigada pelo elogio :) Beijinhos

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